quinta-feira, 7 de março de 2013

a orelha fica ali e o cotovelo é aquilo


Ainda bem que temos a Internet hoje em dia. Clicando num prático link que diz «Clique aqui para ver uma imagem do seu bebê» no baby center, temos acesso a uma imagem do nosso bebé. Suponho que não seja exactamente uma imagem do nosso bebé em particular, mas sim de um bebé qualquer que posou para o desenho. O que me intriga, no caso desta gravura das 17 semanas, é o motivo pelo qual salientaram, de todas partes que constituem um bebé, a orelha direita e o cotovelo esquerdo especificamente. Talvez tenha sido opção do tipo que fez o retrato... pode ter pouca confiança nas suas capacidades de desenho de anatomia, como aquelas crianças que quando fazem um desenho, escrevem "pai" e "mãe" com setinhas a apontar para as garatujas de um e de outro
Uma coisa que me surpreendeu muito nisto da gestação é o facto do bebé deixar depressa de ser o alien fixe da primeira ecografia e se transformar  num ser humano encolhido. Pensei mesmo que fosse uma espécie de pepino cabeçudo e que, às tantas, lá pelos 7 ou 8 meses, as coisas aparecessem estilo pipoca *pop* braços *pop* orelha *pop* pilinha. Nada disso. Registo a expressão concentrada do bebé no desenho, como se estivesse a meditar, todo zen. Por enquanto ele tem muito espaço lá dentro, não é como no fim da gravidez em que se sentirá como eu ontem no metro por causa da greve de comboios. Está a flutuar no líquido amniótico, uma redoma quente e que lhe deve parecer tão infinita quanto o universo. Neste momento já ouve sons e já vale a pena começar com as apresentações mútuas, berradas para a barriga: 'a tua mãe é maluca, vais ver, o pai é que é fixe', 'o teu pai é parvo', 'a tua mãe é que é', 'o teu pai tropeçou no próprio roupão', 'a tua mãe nunca tinha visto o apocalypse now', 'o teu pai não consegue ver um pacote de manteiga mesmo à frente dele no frigorífico' e por aí fora. Estamos a apresentar-nos ao bebé e aconselho todos os pais a fazerem este exercício, porque é bom a criança nascer familiarizada com as respectivas personalidades de um e de outro. Assim já sabe ao que vem e não há cá protestos, como aqueles bebés que eu vejo nos filmes que mal nascem se metem a chorar de desilusão e raiva de lhes ter calhado aqueles pais*. Quero que o meu nasça e que diga logo 'muito prazer, sou o vosso filho, quero ver o apocalypse now e ensinar ao pai como distinguir o pacote de manteiga dos outros lacticínios. Agora quero mamar, com licença'. Eu é que tenho de me contentar com o muito pouco que sei dele. Às vezes faço o exercício de criar personalidades, extrapolando o cruzamento dos meus genes com os da Plaft. Tinha um livro assim quando era pequeno, com bichos, cada página tinha um animal e as folhas estavam cortadas em dois horizontalmente. Podíamos combinar bichos virando as páginas, por exemplo, as patas de uma girafa e o corpo de um hipopótamo e aparecia escrito "girapótamo", a parte de cima de um elefante e a parte de baixo de uma zebra e ficava "zebrafante". Faço isto mesmo a dormir, em sonhos. Que espécie de girapótomo será ele se tiver a inteligência da Plaft e o meu enorme talento? Como será a zebrafante, se for uma rapariga e tiver o feitio da Plaft e a minha humildade? Às vezes as visões são maravilhosas como no caso do girapótomo, outras, um pequeno pesadelo, como é o caso da zebrafante. Mas não sabemos nada por enquanto. Só quando nascer e com a primeira conversa a dois, tu cá tu lá. Também quero perceber depressa o que ele espera de mim exactamente, não quero passar outra vez por um processo de tentativa-erro, já me bastou o início do namoro com a mãe.


*nota: entretanto a Plaft explicou-me que é bom que o bebé chore à nascença, significa que respira etc. ok, anotado, não me vou sentir ofendido se ele chorar.