sexta-feira, 6 de setembro de 2013

92 mil toneladas de TNT

Caramba, um bebé recém-nascido tem uma bateria pior que a de um iPhone. Dorme grande parte do dia. Chego a casa, quero brincar com ela e nada. Às vezes fico à espera, impaciente, a andar de um lado para o outro e ela dorme e ignora-me, mesmo quando a Plaft vai ao WC e eu aproveito para pegar nela e atiro-a ao ar e penduro-a por um pé, danço a valsa com ela ao colo pela casa toda e depois finjo que está a ser farejada por uma matilha de lobos esfomeada que discute entre si se a adoptam ou a devoram viva ali mesmo. A Plaft sai do wc e eu componho a bebé rapidamente, embrulhado-a na manta como um crepe. Nada. Dorme. Chego ao ponto de a raptar da alcofa, quando a mãe está a dormir. Entro de gatas no quarto, abocanho-lhe o baby grow com os dentes e levo-a para a sala, para ver se a acordo. De pouco em pouco tempo, tem de se meter num dos dois carregadores mamários da Plaft que, por sua vez, vai descarregando as suas baterias pessoais e está neste momento num estado mental muito semelhante ao do bebé. Talvez seja um processo de sintonização mãe-filho? A mãe regride e o bebé progride! É assim mesmo que deve ser. Mas não se pense que o bebé fica todo enérgico depois das mamadas. Não senhor. Entra outra vez em sleep mode, às vezes com um fio de baba a escorrer-lhe da boca. A bateria vai carregando muito lentamente... Baby Battery 05%.... 6%.... 7%.... Por isso, é com enorme alegria que encaro os momentos em que o bebé está bem acordado e interactivo! Nem que seja às 4 da manhã! Sei que me vou arrepender disto se ela tiver cólicas um dia. Mas até lá, é muito divertido brincar com ela nesses momentos, mesmo que grande parte da brincadeira se resuma a vê-la fazer expressões faciais nas quais eu tento vislumbrar a sua complexa personalidade. Penso que vai ser actriz como a mãe, porque no espaço de 5 segundos é capaz de exprimir todo o espectro de emoções humanas. É como se fosse uma pessoa com um sintonizador de rádio avariado. Brrll feliz feliz :D bzzt triste :( bzzt X[ dor :S medo bzzz espanto bzzt sono -_- bzzt O_O SURPRESA Bzzzzt Tenho utilizado muitas técnicas romanas de educação infantil. Os romanos eram excelentes do ponto de vista pedagógico e eram grandes conhecedores de puericultura. Os bebés eram enfaixados, submetidos a banhos frios, a exercícios de força e resistência e sem qualquer demonstração de afecto da parte do pai. Ok, a taxa de mortalidade infantil rondava os 80%, mas uma Júlia César não se faz com Brazeltons e falinhas mansas. Não chego a esses extremos, mas ontem foi dia de banhos e pude verificar que a bebé já desenvolveu um reflexo de boiar. Notei que a sua pança redondinha emerge naturalmente. Excelente sinal, já consegue sobreviver a um naufrágio, por exemplo. Depois do banho, seguiu-se a massagem com óleos e unguentos trazidos como oferendas de todas as partes do reino. E hoje de manhã, enquanto a mamã tentava recuperar um pouco de sanidade mental dormindo e o papá fazia o seu ioga e os exercícios de força com os halteres e a bola medicinal adquiridos recentemente na decathlon, a bebé teve o seu tummy time: deitada de barriga no tapete de borracha. Lemos que isso favorece a coordenação motora. Observei-a com a atenção o tempo todo. Devo dizer que não fiquei muito impressionado. Estava à espera que gatinhasse, apesar dos "livros" dizerem que os bebés só começam a gatinhar entre os 6 e os 10 meses e ela só ter duas semanas. Queria que pelo menos ela levantasse a cabeça. Só esperneou um pouco e fungou com um bacorinho quando lhe dava para afocinhar desajeitadamente no tapete, requerendo a minha intervenção para a voltar a colocar na posição de rã atlética e limpar a baba. Decidi aumentar o nível de dificuldade e pousei um haltere em cima do rabo, preso na fralda. Protestou com um "maaah" fraquinho. Substituí o haltere de 3kg por um de 1.5kg*. Também não se conseguiu mexer. Penso que é uma questão de motivação. Quando as baterias dela estão a ficar a zero, com sinais de fome e sono, o sinal discreto e subtil que aprendi a identificar correctamente - como excelente pai observador que sou - envolve mudar de cor para vermelho tomate, esticar os braços com toda a força e dar pontapés violentos e chorar aos berros com a goela amplamente aberta de modo a que os cães no raio de 2km comecem a ladrar. Ocorreu-me que talvez esteja a pedir ajuda aos vizinhos ou aos próprios cães. Eu bem lhe digo "hei, calma, então? é preciso gritar assim?" Sei que este tipo de manifestação poderia passar despercebida a um pai menos atento, mas eu percebo depressa que algo de errado se passa. Registo também que ela contém em si muita energia que só precisa de ser focada em actividades diversas e não apenas no binómio dormir-comer. Uma boa estimativa da energia do bebé pode ser obtida pela fórmula E=Mc2. Para um bebé de 4.3kg temos uma energia de 3.8646e+17 joules, mais ou menos o equivalente a 92 mil megatoneladas de TNT. Por isso, é tudo uma questão de motivação certa!


*Plaft, esta parte dos haltere é ficção, sabes, para efeitos cómicos? :) Sei que há uns meses não precisava de incluir este pequeno disclaimer, mas neste momento estás bastante susceptível e todo o cuidado é pouco. Por exemplo, lembras-te de como entraste em pânico quando a escondi na máquina de lavar roupa e te perguntei qual era o programa para bebés delicados?

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

o pai urso



Um pouco contra a vontade da Plaft, estou a pensar encomendar na Amazon o realistic bear costume.  Ela acha que 600$ é um disparate - apesar de lhe explicar que já tem uma poupança de 125$ - mas eu penso que o investimento podia compensar. A ideia é vestir este fato de urso longe do olhar da Júlia e passear por perto dela. Depois dispo o fato e volto a aparecer-lhe em versão normal, como se não fosse nada. O urso vai interagir com ela, roubando-lhe um cobertor ou um brinquedo, trazendo-lhe mel em troca da papa, brincando com ela, rebolando no chão etc. O urso vai sempre fugir de mansinho quando alguém se aproxima e eu vou trocar de roupa depressa e reaparecer vindo de outra porta como se não fosse nada. O essencial é fazer com que a Júlia acredite que há um urso a viver em casa, que só ela sabe da existência do urso e que é seu dever manter o segredo. Se ela nos tentar dizer que há um urso em casa, nós vamos fingir que achamos muita graça, mas que não acreditamos. É certo que muitos pais preferem optar por fazer a criança acreditar que um homem morreu pelos seus pecados, foi crucificado, ressuscitou e que as vigia o tempo todo a ver se elas não vão para o inferno. Pessoalmente, acho essa fantasia um pouco irreal demais quando comparada com a do urso. Penso que será fácil manter esta ilusão do urso até ela ter quatro ou cinco anos de idade. O ideal era manter isto até à adolescência (ou mesmo depois) mas admito que é um pouco ambicioso demais. Seria óptimo surpreendê-la no Cais do Sodré quando se preparasse para beber o primeiro shot fornecido por um infecto adolescente dois anos mais velho. O urso, pelo uso de comunicação não verbal, poderia fazer-lhe ver que esse comportamento não era adequado para uma princesa da floresta, fosse por dizer que não com o dedo e com a cabeça em gestos reprovadores, fosse por sovar violentamente o jovem, fosse por agarrar nela, atirá-la para cima do ombro e levá-la para casa (talvez apanhando um taxi ou então compro uma pickup para o urso, os ursos andam de pickup) deixando-a nos arbustos do meu quintal. Toco à campainha e fujo, para ter tempo de despir a fantasia, entrar pelas traseiras da casa, abrir a porta da frente e exclamar "já em casa, filha? Que bom, vieste antes da hora!"
Acho que isto tem pernas para andar.

 Já agora, tive esta ideia ontem quando fui à primeira consulta no pediatra. A médica disse-me que ela já reconhecia a mãe e que com o tempo ia reconhecer o pai também. Disse-me aquilo como e fosse para me motivar, mas a verdade é que fiquei extremamente desiludido e amuado. Eu pensava que a Júlia já me reconhecia. Pelos visto, só reconhece a mãe, de acordo com a senhora doutora. Passei o dia a mudar-lhe as fraldas com comentários cínicos como "pois... cá está o estranho a mudar-te as fraldas... nem sei para que me dou ao trabalho... tu não sabes quem eu sou... tanto faz ser eu como outro qualquer" ou a pegar-lhe ao colo e a dizer-lhe "pois, queres colo, mas para ti tanto faz ser eu como um urso da floresta". E pronto. Até me decidir a comprar a fantasia, vou continuar a retaliar contra o facto dela não me reconhecer com as amplas fungadelas que lhe dou na cara, no pescoço e nos refegos, como se fosse um cão a farejá-la curioso, enquanto lhe digo "quem és tu? snif snif snif és o meu bebé? deixa cá ver snif snif snif" Por enquanto ela parece achar divertido, mas quero ver se vai achar graça quando lhe fizer isto à saída da escola ou do ballet.